(Araucaria) [CRAJE] 42o Aniversario - Um Clube Quarentão e seus Pensamentos
Vitor Santos
py2ny.vitor em gmail.com
Terça Março 22 14:02:28 BRT 2011
Parabéns ao CRAJE, que tive oportunidade de conhecer
há, talvez, vinte anos atrás...
A crônica foi magistralmente escrita, e espero que todos
vocês continuem se encontrando no Clube, pelas décadas
que virão...
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PY2NY Vitor Luis Aidar dos Santos
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Em 22 de março de 2011 13:50, PP5AX - Carlos J Mazzoni Cintra <
pp5ax em craje.org.br> escreveu:
> Repassando um texto feito para o 42º aniversario do CRAJE (22/03/1969)...
> uma historia longa para um clube de radioamadores....
>
>
> ------------------------------
>
> *Enviada em:* segunda-feira, 21 de março de 2011 23:13
> *Para:* craje em googlegroups.com
> *Assunto:* [CRAJE] 42o Aniversario do CRAJE - Um Clube Quarentão e seus
> Pensamentos
>
>
>
> CRAJE - Crônica de um Quarentão
>
>
>
> Eu nasci em 1969, poucos meses antes do homem chegar a lua, o Brasil fervia
> com os preparativos da copa no México de 70, a ditadura militar estava em
> seu periodo mais duro... Que infância foi aquela! ... Eu era uma criança que
> podia ter tudo, meus pais tinham um enorme amor por mim, eles eram muito
> importantes na cidade, influentes e bem sucedidos, podiam me dar do bom e do
> melhor. Com menos de dois anos de idade me brindaram com um quintal com
> árvores enormes, mais de 2 mil metros quadrados só para mim, ao lado do
> antigo camping do CCB e a menos de 500 metros do centro da cidade de
> Joinville. Quando eu tinha mais ou menos 3 para 4 anos de idade, construíram
> para mim uma casinha, e que casinha! ... Com tamanho de sobra para que eu
> crescesse e aparecesse. Nesta casa eu poderia festejar meus aniversários com
> muitos amigos, com conforto e sem problemas de espaço, tinha até uma ampla
> área de estacionamento, arquitetura assinada por um grande arquiteto
> catarinense dos anos 70 e tudo o mais. Logo, parte dos meus brinquedos foram
> colocados no alto de uma bela torre e durante algumas noites da semana e
> também nos finais de semana lá vinham meus amigos... meu pátio ficava cheio
> de Variants, Fuscas, TLs, Opalas, Brasilias e até carros importados... Aos
> sábados era sagrado – meus amigos vinham ficar comigo e desfrutar da minha
> casa de arquitetura arrojada, minhas árvores, do cheiro de floresta quase no
> centro da cidade, do barulhinho da corredeira da centenária captação de água
> de Joinville... Ficavam batendo papo e brincando com os rádios, meus
> brinquedos prediletos. Eu me sentia muito feliz pois, de alguma forma, sabia
> que tinha nascido para isto.
>
>
>
> Certamente devia causar inveja na meninada da minha idade, tanto da minha
> cidade como de muitas outras, pois que criança tinha o que eu tinha e quem
> poderia dizer onde eu poderia chegar só pelo que já havia conquistado em tão
> pouco tempo de vida. Tempos incríveis aqueles... eu era o centro das
> atenções... festas frequentes, almoços comunitários, contestes nacionais,
> internacionais, visitas ilustres, políticos, candidatos a cargos públicos,
> famílias inteiras de amigos vinham ficar comigo nas noites de quarta,
> quinta, sábados e tardes dos domingos.
>
>
>
> Sem dúvida eu era um menino com cara de alta sociedade, mas tinha amigos em
> todas as classes sociais, pois meu brinquedo predileto não via cor, raça ou
> dinheiro no bolso... mas muitos tinham até receio de se aproximar de mim,
> tamanho era o luxo da minha casa, pois lá nos idos de 1975, eu certamente
> era o único menino com uma casa linda e nova só para mim, especialmente
> construída para minhas brincadeiras com os amigos.
>
>
>
> Me lembro bem que, ainda meio menino, já me metia em assuntos de gente
> grande... ajudava na localização de pessoas, colocava pessoas de outros
> estados e países via rádio falando ao telefone com parentes, ajudava
> encontrar remédios raros e vitais para doentes, auxiliava no contato de
> pessoas sem comunicação devido a enchentes e tempestades... eu fazia muita
> coisa legal... todo ano aparecia uma novidade, um evento, uma
> mobilização... que anos foram aqueles!
>
>
>
> Sem perceber fui deixando de ser criança, aos 14 ou 15 anos de idade já era
> um jovem rapaz quando comecei a perceber que muitos amigos que eu conseguia,
> depois de um tempo me abandonavam... deixavam de ir me ver... e quando iam
> me ver eu logo lhes perguntava: - Porque diabos você esta tão sumido? As
> vezes as respostas eram vagas e eu ficava sem entender, mas o que mais me
> angustiava era algumas respostas do tipo: - Eu não venho mais te ver porque
> um outro amigo seu não é mais meu amigo, não gosto mais dele, ele agiu
> errado comigo... Nisto eu perguntava: - Mas que culpa tenho eu? Porque
> você não é mais amigo deste meu outro amigo, é motivo para não querer mais
> saber de mim, me visitar, contar por onde anda, como esta indo,... não posso
> mais contar contigo?
>
>
>
> Mas naquela época de juventude a vida era frenética, trazendo sempre novas
> pessoas, tinha uma turma legal, os faixas do cidadão, muitos acabavam se
> tornando radioamadores e se achegavam, uns ficavam pouco comigo, outros mais
> tempo... já na minha fase adulta, no alto dos meus vinte e poucos anos, o
> mundo já era bem outro, tinha gente que dizia: - Este seu brinquedo já não
> tem mais graça, agora o negócio é um tal de TK82, CP300, Sinclair 8085 que
> rodavam um tal de CPM... este negócio de rádio, válvula, manipulador,
> radioteletipo já era... Eu nem ligava muito, pois achava que o meu brinquedo
> nunca poderia ser substituído por nada.
>
>
>
> Me lembro bem que já adulto, entre meus 25 e 30 anos, percebi que
> vagarosamente meus amigos escasseavam, minha casa já não ficava tão cheia e
> raramente tinha crianças correndo em meu pátio. Não me preocupava, pois
> sabia que os adultos tem menos amigos que os adolescentes, é natural, mas a
> qualidade das amizades deviam ser melhores pois já tinha amizades de
> décadas. Mas foi justamente por esta época que comecei a sentir o peso da
> idade, pois muitos dos meus pais já não estavam mais comigo, outros apenas
> se afastaram de mim... será que fiz alguma coisa errada? ... por mais que eu
> soubesse que isto era natural, não estava preparado para perder meus pais,
> não tão cedo, sentia muita falta da atenção e do cuidado deles, mas tinha
> que entender que eles não seriam eternos.
>
>
>
> Entrei na minha década dos 30 anos tentando sempre me renovar, já haviam me
> avisado que minha brincadeira não tinha mais graça, mas já haviam passado os
> PC XT, os AT, os 286 que eram maravilhas modernas e mesmo assim continuavam
> a gostar do meu velho e bom radio. Até porque na mão dos radioamadores os
> PCs viraram máquinas de Logbooks, Manipuladores de CW, Decodificadores de
> Modos Digitais... saquei que este tal de PC não era um inimigo, era um
> aliado... mas mesmo assim sentia que minha sala ficava um tanto mais vazia.
> Seria um sinal dos tempos modernos?
>
>
>
> Me lembro como se fosse hoje a conversa na minha sala sobre as BBSs, agora
> era possível a troca de programas de computador através da conexão com um
> servidor e termos infinitos programas em nosso poderoso HD de 270MBytes nos
> nossos PCs interligados pela poderosa rede Novell 1.1 com cabo coaxial. Mas
> nada me amedrontou tanto como quando, em uma tradicional reunião de
> quarta-feira a noite, alguém com voz de sentença disse: - Já temos no Brasil
> algumas escolas militares e pesquisadores de universidades ligados a
> Internet e eles podem se comunicar e trocar arquivos livremente, se isto
> pegar mesmo, ninguém vai querer ficar fora dela... acreditem... o
> radioamadorismo esta com seus dias contados! O mundo desabou para mim.
>
>
>
> O tempo foi passando e por um motivo ou outro a minha sala de vistas e meu
> shack ficavam menos cheios. A internet era acessada por modens de incríveis
> 56Kbps de velocidade máxima, cabearam a cidade inteira para a TV por
> assinatura, as pessoas passaram a trabalhar mais horas por dia, as crianças
> passaram a exigir ir ao parque temático e ao shopping center nos finais de
> semana... deve ser isto, pensei... as pessoas estão sem tempo para virem
> aqui me visitar, mas quando elas tiverem um tempinho virão, com certeza...
>
>
>
> Numa manhã de Janeiro de 2002 fui surpreendido por uma cobrança de imposto
> colocada embaixo da minha porta... como? Desde que foi construída a minha
> casa, nunca havia sido cobrado nenhum imposto, sempre soube que tinha valor
> reconhecido de utilidade pública por Lei Municipal e Estadual, desde que
> tinha um ano de idade. Fiquei muito apreensivo com esta novidade, pois até
> então nunca havia tido que arrecadar dinheiro para poder pagar o direito de
> continuar em minha própria casa, não me foi dado o direito de gerar dinheiro
> através de minhas ações, sempre me disseram para que não me preocupasse com
> renda ou lucro, pois minha função era social e pública... pensei... Ok, e
> agora?
>
>
>
> O tempo foi passando, passando... ouvi muitas opiniões, mas ninguém me
> trouxe o conforto que precisava, sinto que tenho menos amigos do que
> gostaria ou poderia ter... mas, é a vida... hoje me lembro que estou
> completando meus 42 anos de idade. Uma jornada e tanto, não? Principalmente
> para um cara como eu, em um País como o nosso em que pouca coisa dura tanto
> tempo.
>
>
>
> Engraçado que muitos dos meus amigos nasceram 15 ou 20 anos depois de mim,
> mas por alguma razão, eles não vêm nenhum problema em nossa diferença de
> idade, aparecem sempre em minha casa, dão risada alto, fazem bagunça, fazem
> perguntas e através destas perguntas me fazem sentir útil e vivo, pois sei
> que tenho algo (talvez muito) a ensinar sobre nossa estranha mania de
> brincar com antenas, cabos, rotores, softwares, rádios, lineares e velhas
> amizades.
>
>
>
> Pensando hoje, do alto dos meus 42 anos de idade, acho que não sou nem novo
> e nem velho, posso até dizer que estou no meio da vida... talvez não, quem
> sabe? Mas não posso deixar de ver o futuro com esperança de um lado e receio
> de outro.
>
>
>
> Pode ser que continue chegando sempre gente nova em minha sala, dispostos a
> aprender, ensinar, compartilhar conhecimento e dispostos a cuidarem um pouco
> de mim, desta forma, o ciclo continuará por muito e muito tempo e eu sempre
> estarei feliz com meu destino.
>
>
>
> Por outro lado, sei que se um dia não houver nem um pequeno grupo de amigos
> para zelar por mim, estarei acabado definitivamente, mas espero que se isto
> acontecer um dia, não me deixem acabar como um velhinho abandonado em um
> asilo, sem ninguém para compartilhar meus últimos dias, relembrar os grandes
> momentos, contar velhas histórias, ficar com meus QSLs... sabe, prefiro
> morrer de súbito a uma lenta agonia do abandono, mas para ser sincero, por
> este lado procuro nem pensar.
>
>
>
> CRAJE – PP5CIT - em seu 42º Aniversário
>
> PP5AX – Carlos J. M. Cintra – 22/03/2011
>
>
>
> *SE você leu esta crônica até aqui, certamente não vai deixar de ir
> CUMPRIMENTAR SEU CLUBE na festinha de aniversário dia 26/03 (SABADO) a
> partir das 19:30h VAI TER UM SABOROSO GALETO NA BRASA. SERA ENVIADO UM
> COMUNICADO COM OS DETALHES.***
>
>
>
> 73's
>
> Carlos J. Mazzoni Cintra - PP5AX - Joinville - SC
>
> Tel (47) 3027-4392 ou (47) 8859-6909
>
>
>
>
>
> --
> ---
> E-mail oriundo do Grupo "CRAJE" no GoogleGroups.
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> Para postar neste grupo, envie um e-mail para craje em googlegroups.com
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> Para ver outras opções, visite
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